Arquivo da Categoria ‘O Olhar de….’

O olhar de…

21 de Janeiro de 2018


foto: joão espinho

Desta vez o desafio foi diferente. A Rita escreveu primeiro e eu tive que encontrar uma imagem.
Foi este o resultado.

    “Há sempre um momento que nos separa. O momento em que tu morres e em que eu assisto, impávido, ao teu desaparecimento. À beira do abismo. Na fragilidade visceral a que me condenas, não pela tua ausência física, mas pela constante presença emocional com que me manipulas os dias.
    O nosso amor foi sempre a minha melhor criação, alimentada pelos meus pensamentos doentes e pelos fugazes encontros a que cedemos. Uma obra cuja temporalidade e materialidade suspeitas, me fazem agora crer, na possibilidade da sua não existência, sempre que te vejo morrer para o amor. Para o nosso amor.
    Sou confrontado com a necessidade que as coisas e os acontecimentos têm, de ser apagados. É por isso que te matas, não é? Diz-me. É por isso que te matas? Queres apagar-te de mim, mas as marcas invisíveis não te deixam sair-me da pele.
    Contigo, vivo constantemente à beira do abismo. Há sempre um momento que nos separa. O momento em que o amor vaza, escorre e cai morto, depois da despedida do teu corpo inerte. Sempre precisaste de sangue para que o teu nome ficasse gravado no meu coração.
    Diz-me. Diz-me com clareza. No amor, qual é a vantagem de ser ferido, quando é por medo que morremos?”
    Rita Nascimento
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O olhar de…

1 de Janeiro de 2018

oceano
foto: joão espinho

    “É preciso escrever com as mãos limpas
    o eco da poesia que corre
    entre as margens de erro da vida;
    e emendar o céu…
    com o olhar simples
    de quem apanha as estrelas distraídas
    e voa, para que se abracem,
    encurtando a distância
    que, sob qualquer circunstância,
    cabe inteira num poema.
    Sem fragmentos, respiração suspensa
    e uma história imóvel
    entre os gracejos de um copo de vinho
    que aviva veloz, a memória da tua voz
    doce e calma a léguas de mim…
    É preciso corrigir a lonjura sempre que chove
    e o dilúvio da cidade solitária se abate sobre os nossos corações.
    … escorrem as emoções, ao sul
    desaguando no mar azul
    que te traz…
    e só termina nos meus olhos.”
    Rita Nascimento
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O olhar de…

27 de Dezembro de 2017

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foto: joão espinho

    “Em terra de pouca sorte,
    insípida p’las águas do pranto,
    dizia o vento – que corria parado –
    memórias cansadas,
    ao entardecer da vida num banco
    de praça, deserta e despida,
    tricotando, incerta, a nudez
    da memória de outrora, esquecida.

    E à luz da janela improvável,
    na cal já gasta esculpida,
    vivia de língua amputada
    o silêncio da despedida.”
    Rita Nascimento

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O olhar de…

19 de Dezembro de 2017


foto: joão espinho

    “Não creio que sejas tu mais do que outros.
    Tao pouco que exista alguém que a mais se eleve
    se posto lado a lado com o mendigo
    que dorme ao relento da vida,
    envolto no sopro de um cobertor de memórias
    sob um alpendre que lhe ignora, irrisórias
    as tempestades e intempéries que o papelão abriga.
    Casa sem tecto e paredes de papel onde o coração dormita.

    Chego a invejar-lhe o corpo e alma,
    essa que sente tudo o quanto por ela passa
    por mais ínfimo que seja,
    por mais desprezível que nos pareça
    por mais banal que se tenha tornado às nossas mãos.
    Um corpo sem “senãos”, que com pouco se enjeita
    de alegria partilhada
    e onde nunca o supérfluo se ajeita;
    Aos contornos, frequentemente largo
    o amargo cheiro das pregas vazias.
    Assim se parece a nossa necessidade de enchumaços,
    pecados de luxúria pendurados
    nos ombros, nos braços e enchendo-nos a barriga.
    Almofadados os pés,
    enterrados que estamos em créditos até aos joelhos
    para bem-parecer até às orelhas.

    Não creio que seja ele menos do que tu,
    ou eu mais ou menos que qualquer um de vós.
    A diferença entre nós mora num arranha céus
    de cem andares. Onde somos vizinhos.
    No rés-do-chão sente-se pouco,
    E os que muito sentem, escolheram o rés-do-céu para viver.
    E sonhar no centésimo andar, a contar do vale dos mortos.
    Não creio que tenhamos nós mais do que eles.
    Se uns têm mais alegria, outros têm mais prostração;
    Se uns têm mais tempo, noutros é maior a dilação;
    Se uns doam mais sorrisos, outros fazem as lágrimas florir
    sem sentir, que todos nós temos alguma coisa
    entre nascer e morrer. Espaço cronológico que nos limita a existência.
    Pode apenas ser ar nos pulmões,
    essa qualquer coisa que temos.
    Mas temos. E dar-lhe-emos valor?

    … é amor do Criador, o oxigénio que a todos brinda, por igual.”
    Rita Nascimento

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O olhar de…

18 de Dezembro de 2017


foto: joão espinho (aqui)

    “Bati-te à porta, mas não respondeste.
    Espreitei. Espreitei pelo postigo aberto, como que a desafiar o olhar de quem de soslaio passava.
    Estava escuro. Inclinei-me mais um pouco. Já com a sensibilidade visual mais apurada, consegui vislumbrar um rasgo de luz ao fundo à esquerda. O cheiro era o mesmo que sempre conhecera. Fresco e doce, suave, mas enigmático. Detive-me. Hesitei em chamar por ti. Uma hesitação daquelas que temos quando jovens, quando a incerteza se abate. Fiquei a pensar, e mais uma vez olhei aquele corredor, onde as portas se cruzam, onde o chão acusa o desgaste dos anos, e onde a luz, ora trémula, ora insistente, faz brilhar a alma que sei ali habitar.
    Bati-te à porta mas não respondeste.
    Espreitei pelo postigo aberto, e ao fundo, lá estavas tu, vida! Fui ao teu encontro, e de mãos dadas seguimos.
    Helena Palma
    17-12-2017
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O olhar de…

4 de Dezembro de 2017


foto: joão espinho

    “Escrevo poemas na água à espera que um dia tu tenhas sede.”
    Vítor Encaranação
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O olhar de…

28 de Novembro de 2017

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foto: joão espinho

    “É teu o silêncio. É tua a escuridão. É de ti o vazio que desce a rua num rodopio. É tão tua a inquietação… a palavra secreta que ninguém quer saber. A mordaça no plaino verde que te quer a morrer. É teu o pecado, o lugar em desassossego. A paisagem que passa ao lado. A tua figura a tremer de medo. É teu o outono derradeiro, onde se acinzentam os pensamentos e morre a esperança… é tudo teu até ao ponto da incerteza. Até à brancura que carrega a leveza. É também teu o largo de lamentos, é por ti que vem o silvar dos sonhos. É tudo teu quando nada te dão. É para ti o silêncio que cala a canção!”
    Jorge Barnabé
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O olhar de…

23 de Novembro de 2017

Poucos se recordarão de “O Olhar de…” espaço que mantive aqui de 2007 a 2009. Escrevia eu em Setembro de 2007:”É um espaço onde alguns colunistas convidados escreverão sobre uma fotografia que lhes despertou atenção. Serão olhares diferentes. Novas interpretações”.
Pretendo retomar essa rubrica. O processo é fácil. O leitor escolhe uma das minhas fotografias (foto: joão espinho) que tenha sido publicada no blog, e escreve o que lhe apetecer. Haverá leitores convidados, mas todos os que por aqui passam podem deixar o seu contributo na caixa de comentários. Têm muito por onde escolher. Em 2018, quando o blog completar 15 anos, pode ser que haja uma surpresa. Haja saúde e vontade de fotografar. Para auxiliar, podem olhar para a secção fotografia. Até logo.

Hoje, para recordar, destaco dois amigos que já partiram:

mensagens-que-o-tempo-apaga.jpg
foto: joão espinho

    Foi por certo precisa muita determinação e intencionalidade para tratar este tema a preto e branco, descarnando a fotografia da cor, elemento por certo dominante no processo de criação da sua jovem autora, aluna do 6º ano, a “Tu sabes” (e o feliz Gonçalo é que sabe), que terá à volta de 12 anos, e que deve estar a viver o seu primeiro amor.
    A renúncia à cor na reprodução publicada terá muito provavelmente a intenção de nos chamar a atenção para o significado da mensagem, por muito que a forma não tenha sido desprezada. Suportou bem essa renúncia.
    O nascimento do amor na entrada da adolescência pode ser preocupação para os pais, mas é enternecedor para os outros. Preocupante é bem sabermos, mesmo os não puritanos, que com a crescente banalização do sexo dentro de escassos três ou quatro anos o Gonçalo e a Tu Sabes se poderão tornar clientes mais ou menos assíduos da pílula do dia seguinte. Este passar, numa só geração, do 8 para o 80, gera nos mais velhos um certo desconforto.
    Melhor teria sido talvez ficarmos pelos 40.
    Horácio Flores

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foto: joão espinho

    A ferrugem da proibição. O trânsito dos olhares não se faz para lá da porta, por entreaberta que esteja. Houve quem escrevesse é proibido proibir! Muita gente não percebeu… E as coisas proibidas são, lá no fundo, tão descarnadas da realidade como uma porta que já nem o é…
    Rui Sousa Santos

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Para uma busca mais fácil: aqui

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O Olhar de … Bé

29 de Agosto de 2009


foto: joão espinho

    Na noite da vida
    A alma é escura e vazia
    A sua porta de cadeados enfeitada.

    Lá fora, do nada, surge o murmúrio da Madrugada
    Luz suave e crescente, depositando na alma
    As primeiras sílabas de palavras ainda desordenadas e sem rima.
    E de estrofe em estrofe, de verso em verso,
    Se vai construindo o Poema de todos os poemas.

    Os cadeados, esses,
    Assim enferrujados pelo tempo
    Vão quebrando lentamente
    E da Alma, se abre a porta
    Rendida aos brilhos do dia…

    …dos nossos Olhares!

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O Olhar de … Maria Árvore

28 de Abril de 2009


foto: joão espinho

    Os telhados abrigam-nos das intempéries. Transmitem-nos a segurança de que o céu não nos vai cair em cima da cabeça, como o temiam os gauleses. E porém, é nos momentos em que abandonamos a protecção do telhado e saímos para a rua indefesos perante qualquer condição climática que descobrimos o esplendor do arco-íris. Até guardamos mais vivos na memória esses momentos únicos e mágicos. Tal como acontece com os que a objectiva do João Espinho fixa.
    Maria Árvore
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O Olhar de … Rui Sousa Santos

18 de Abril de 2009


foto: joão espinho

    A ferrugem da proibição. O trânsito dos olhares não se faz para lá da porta, por entreaberta que esteja. Houve quem escrevesse é proibido proibir! Muita gente não percebeu… E as coisas proibidas são, lá no fundo, tão descarnadas da realidade como uma porta que já nem o é…
    Rui Sousa Santos
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O meu olhar

9 de Abril de 2009


foto: joão espinho

Caminhando, passei por ti sem te olhar.
Mas o teu perfil alertou-me
para o gemido das letras que desenhavas no horizonte.
Abraço-me a ti e ajudo-te a escrever mais um verso
onde me ditas sonhos
consentidos
e é ali, quem sabe, que me declaras a vida,
semeada entre os gritos do sol que adormece
e a noite de luar feita de segredos.
Agora és a árvore onde me agarro, me abraço
E cuja sombra esconde os nossos beijos.

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