Célia -48-
15 de Março de 2005Foi com ternura que lhe olhei profundamente.
Sabia que Célia, naquele momento, precisava essencialmente de carinho, ternura e que as palavras fossem poucas. As minhas e as dela.
O rompimento, que assumira em privado, estava a causar-lhe problemas na redacção da revista onde trabalha. Intromissões vindas do exterior, mas que ela soube identificar, quase que lhe destruíam a carreira e a levavam ao abandono do periódico.
Não quis estar a pedir-lhe definições quanto ao futuro. Tinha receio que me questionasse sobre Mariana e tudo o que se passara nas últimas semanas.
Agora queríamos só tentar olhar-nos e compreender-nos. Sabíamos da fortaleza que teríamos que construir à nossa volta. Pensei, quando lho disse, que estaria a ajudá-la, mas Célia não perdeu tempo:
“ e tu estarás a reconstruir as tuas defesas?”.
Ela sabia e tinha permitido que me entregasse. Mas percebia também as reservas. Tentei desviar o assunto. Em vão. “Sem a tua segurança não conseguirei dar o passo seguinte”.
Questionei-me quantos seriam os passos seguintes. O que faltava para que os pesadelos e medos se diluíssem. Uma mensagem cai-lhe no telefone. Levanta os olhos, onde vejo uma tristeza que me atormentou, e diz-me: “É ele. Quer uma última conversa comigo”.
De repente vi, como num filme que nunca mais termina, imagens das primeiras hesitações.
Nessa noite quis ficar só. Entreguei-me a escrever. Ignorei as mensagens de Mariana. Fechei mais esta porta.