Dez 31 2016
RIP – Figura do ano 2016
De acordo com as crónicas que por aí proliferam, o ano de 2016 terá sido marcado pela morte de muitas figuras públicas, desde actores a artistas de música, passando por desportistas, escritores e muita gente dos diversos mundos do espectáculo, das artes, da ciência, etc…
Vamos aceitar que assim tenha sido.
Para nós, o que mais nos toca é o desaparecimento de familiares próximos e de amigos chegados. Mais chocados ficamos quando esse desaparecimento acontece de forma súbita e inesperada, assim como quando atinge os mais novos que, num ciclo normal da vida, cá deveriam continuar por muitos mais anos. Recordo, muito rapidamente, e para dar exemplos de quem era da nossa região alentejana, a morte imprevista de Nicolau Breyner e de Manuel Castro e Brito. Paz à sua alma, que descansem em paz. Ou como passou a ser moda, principalmente nas redes sociais, RIP.
Mas, e desculpem-me a linguagem, porra para o RIP.
Explico
Na maior parte dos obituários das agências funerárias, que agora nos dão conta, em tempo quase real, das mortes que vão sucedendo, é recorrente aparecerem uns RIP, sinónimo julgo eu, do pesar pelo falecimento de alguém e que, por qualquer razão, não podemos manifestar de viva voz aos familiares e amigos.
Durante algum tempo segui com atenção as páginas online de diversas funerárias e constatei várias coisas. Primeiro, que há uns rip’s que são mais intensos do que outros, pois fazem-se acompanhar de bonequinhos a verter lágrimas ou de velas incandescentes, reforçadas por “mais uma estrela no céu” a que, tem que ser, somam mais umas lágrimas.
Depois, o que achei mais estranho, foi a constante participação de algumas pessoas que ripavam (de rip) ora em alguém que tinha falecido num longínquo Carcavelinhos-de-Cima ou numa casa nas vizinhanças. A Dona Alísia de Sousa, que faleceu aos 87 anos, num monte isolado na serra do Caldeirão, teve também direito a alguns RIP’s, o que deixou os familiares muito sensibilizados mas, simultaneamente, atrapalhados, por não encontrar forma de agradecer pessoalmente aquilo que pareciam ser as condolências.
Desaparecidos os cartões-de-visita, que deixávamos nas casas mortuárias durante os velórios, e onde simplesmente escrevíamos “s.p.” (sentidos pêsames), optou-se agora para se ir ao Facebook, escrevendo-se um epitáfio simples mas eficiente: RIP – forma abreviada de requiescat in pace – locução latina que significa “que repouse em paz” e utilizada pelos anglófonos como “rest in peace”.
Isto é, deixámos de saber dizer, ou escrever, sentidas condolências, sentidos pêsames, ou outras expressões muito mais portuguesas e com muito maior significado, para nos abreviarmos num simples e frio R.I.P.
Como epitáfios poderemos voltar a usar o “descanse em paz” ou, para os mais crentes, paz à sua alma. Aos familiares e amigos, poderemos voltar a dizer “sentidas condolências”, “sentidos pêsames”, “lamento muito”, e tantas outras afirmações de pesar. Se o voltarmos a fazer futuramente, pode ser que estejamos a enterrar o ano que vai terminar.
Aproveito para desejar, a todos os que por aqui passam, um feliz ano novo e , já agora, RIP 2016.
Crónica escrita para a Rádio Ourique.