Mar 19 2008
À sombra de uma azinheira
No jornal “Ecos de Grândola” e sobre a polémica surgida relativamente à sede local do PCP, escreve José Horta:
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“Há muitos anos, logo a seguir ao 25 de Abril, o Partido Socialista teve sede num edifício da Câmara, no antigo Prédio Barahona, onde hoje funciona a Biblioteca Municipal. Um belo dia foi posto na rua e logicamente teve que ir alugar um espaço para desenvolver a sua actividade. A Câmara de então teve alguma complacência ou arranjou alguma nova sede para esse partido?
O PSD, quando a sua sede foi comprada pela Câmara, o que lhe aconteceu? Teve que ir alugar uma casa!
E os partidos da chamada extrema-esquerda, quando acabaram as situações de ocupação pós-revolucionária, será que a Câmara lhes arranjou alguma sede?
E que tratamento mereceu o próprio MDP-CDE, no final da sua existência?
Então porque é que o PCP, que foi poder quando todas essas situações aconteceram, vem agora com a arrogância, herdada dos anos em que dominava a autarquia, exigir à Câmara que resolva a situação? (…)”
À sombra de uma azinheira
“Crónica de uma morte anunciada”
“No dia em que iam matá-lo, Santiago Nasar levantou-se às 5.30 da manhã para esperar o barco em que chegava o bispo”.
Assim começa a “Crónica de Uma Morte Anunciada”, um belíssimo livro do escritor colombiano Gabriel Garcia Marquez.
Logo nas primeiras linhas ficamos a saber o final da história, mas o talento do escritor, com a sua extraordinária arte de contar, prende-nos até ao fim levando-nos inconscientemente a desejar que o jovem Santiago não se encaminhe para a morte, que os irmãos Vicario desistam dos seus propósitos ou que alguém o consiga avisar.
Mas a verdade é que o destino estava traçado e Santiago Nasar naquele dia sai de casa, precisamente por aquela porta, para encontrar a morte.
Quando li o comunicado do PCP sobre a decisão tomada pela Câmara de rescindir o contrato de arrendamento da sua sede local, e quando posteriormente fui observando as reacções de alguns dos dirigentes desse partido, não pude deixar de pensar neste romance de Gabriel Garcia Marquez.
Não que o estilo das intervenções seja elevado ou que a argumentação seja convincente. Antes pelo contrário.
Mas porque, tal como no romance, o destino está traçado e só o PCP parece não entender.
De facto a aplicação do Decreto-Lei 280/2007 de 7 de Agosto, que veio regulamentar nomeadamente a gestão dos bens imóveis das autarquias locais, é clara neste caso: uma vez que a Câmara resolveu reclamar o edifício, o mesmo terá de ser desocupado no prazo de 120 dias, cabendo ao inquilino uma indemnização de 12 vezes o valor da renda mensal. E nada mais.
Que pretende então o PCP?
Uma saída digna, como afirma, ou um tratamento de favor?
Avivemos algumas memórias:
Há muitos anos, logo a seguir ao 25 de Abril, o Partido Socialista teve sede num edifício da Câmara, no antigo Prédio Barahona, onde hoje funciona a Biblioteca Municipal. Um belo dia foi posto na rua e logicamente teve que ir alugar um espaço para desenvolver a sua actividade. A Câmara de então teve alguma complacência ou arranjou alguma nova sede para esse partido?
O PSD, quando a sua sede foi comprada pela Câmara, o que lhe aconteceu? Teve que ir alugar uma casa!
E os partidos da chamada extrema-esquerda, quando acabaram as situações de ocupação pós-revolucionária, será que a Câmara lhes arranjou alguma sede?
E que tratamento mereceu o próprio MDP-CDE, no final da sua existência?
Então porque é que o PCP, que foi poder quando todas essas situações aconteceram, vem agora com a arrogância, herdada dos anos em que dominava a autarquia, exigir à Câmara que resolva a situação, atirando para cima da mesa “três alternativas de espaços com condições adequadas” para nova sede? E porque é que ainda não teve a coragem de explicar ao povo de Grândola que os tais três edifícios são privados? É para a Câmara, do erário público, retirar a verba e pagar a renda?
Com que justificação?
Será por ter usufruído durante todos estes anos de um enorme edifício histórico, que progressivamente deixou degradar?
Ou será porque na verdade não quer resolver o “seu problema” mas sim arranjar uma bandeira de luta a “defesa da grande sede” porque quer manter o mito do “grande partido” e da “grande máquina”?
Dignidade, claro que sim! Mas arregimentar “povo” (?) do concelho e dos concelhos vizinhos para se manifestarem como aconteceu na última Assembleia Municipal, com arruaça e falta de educação, não me parece o caminho mais digno nem o mais proveitoso até em termos eleitorais!
Dignidade sim, mas se ainda for possível com a mesma que tiveram noutros tempos os restantes partidos de Grândola: procurando pelos próprios meios a sua nova casa!
Porque em democracia todos somos iguais.
José Horta
20 de Março de 2008 às 12:55
o problema é que o PC sempre pensou (e continua a pensar!) que é o partido-pai da democracia.
Não é um entre iguais. É muito mais do que outros e, por isso, apregoa e pavoneia a sua superioridade moral.
às vezes é apanhado na curva…