Fev 01 2008
O Olhar de … Manuel Vilhena
foto: joão espinho (publicada aqui)
Começo com uma lapalissada, não, com duas – só desaparecem fotografias a quem as tira e o facto de se saber onde está tal coisa não impede que se dê a mesma como desaparecida.
Vi esta foto aqui por duas vezes. Na primeira, mal a contemplei, vi-me transportado para os campos para lá de Ourique, para os primeiros colos da serra que se espalha por toda a largura do reino, a separá-lo naturalmente do Algarve. Para aquela imensidão quase despovoada que se perde de vista. Para o meu deserto.
Ali, num certo dia do ano 2000, andando em busca de memórias perdidas e de horizontes largos, tropecei num portal de um cemitério que ostentava a data do próprio ano jubilar de 2000 e cuja singela cruz me fez logo cativo. Como se uma entre as vulgares cruzes de pedra fosse coisa muito para além do já visto.
A verdade é que aquela imagem, que era magnífica, dadas as condições de luz e de ermamento e por ser a primeira vez que via em letra de pedra o mágico número dos três zeros, causou ainda assim uma certa decepção porque eu procurava ali outra coisa que não aquela – um cemitério antigo, não um acabado de renovar.
Enquanto ali me detive, já perto do sol-posto, as cores perdiam calor e eu substituía, consciente, uma memória por outra.
As fotos desses dias sei onde estão. É pouco provável que apareçam. Sei que há lá uma que é a que motivou estas linhas. Mesmo que não exista a não ser na minha memória.
Memória substituída esta. Mais uma vez. Por esta foto do João.
É que também lá está um rosto feminino. Um só? Divisam-no(s)?