Jan 27 2008
Plof!
A estreia mundial, anunciada com pompa e demasiada circunstância, a que a sala de espectáculos do município bejense aderiu, da ópera “Das Märchen”, terá tido um total de cerca de 500 espectadores/ouvintes, apesar de a mesma ter tido projecção em 14 salas do continente e ilhas.
Não sei quanto custou e qual foi a participação do Estado neste plof cultural.
Mas sei que a política de subsídios à Cultura deveria ser sujeita a um rastreio apertado.
Digo eu!
(segundo o DN em Beja terão assistido cerca de 80 espectadores. Um quarto de sala, portanto.)
28 de Janeiro de 2008 às 0:34
“Digo eu!” – mas dizemos mal.
A política de financiamento às práticas culturais tem um rastreio apertado.
Exige planos, justificações, previsões – ancorados em competências que têm que ser comprovadas.
Acompanhamento com reuniões periódicas e, finalmente, relatórios. Muito factuais.
É um facto que padecemos da patética percentagem do Orçamento do Estado para a Cultura.
Mas, por favor, chega de bater sempre na tecla do nº de público abrangido por esta ou aquela intervenção: há muitos factores de que dependem a afluência do público a um espectáculo – desde as rotinas instituídas – ou à falta delas – à ausência ou fartura de promoção, passando pelas ondas da moda, para citar as mais óbvias.
Seria desejável que “Das Märchen” tivesse tido mais público para o esforço de transmissão em directo? Concerteza. Mas uma obra daquela natureza – falamos de música erudita contemporânea – nunca será para multidões.
Para isso parece que continua a existir o futebol.
28 de Janeiro de 2008 às 0:35
Não foi uma estreia mundial, quanto muito, foi uma estreia nacional. Foi pouco divulgada a (nesse) nível nacional, penso eu, mas a maior crítica que posso fazer é o tipo de espectáculo que fora escolhido para essa experiência. Uma ópera de estilo moderno que nem toda a gente entende (nem eu…) não é lá muito apelativo.
Também não sei qual é que foi a participação do estado nesse projecto, mas sabendo que a maior parte das entidades envolvidas recebe subsídios do estado será fácil de concluir deonde é que veio a maior parte da verba. Fala-se em 1 milhão de €, dinheiro que, em meu ver, podia ter tido um melhor destino em apoiar instituições no interior do país que apresentam obra durante o ano todo e não só e apenas uma produção megalómana (onde é que já ouvimos isso?)!
Tenho dito!
28 de Janeiro de 2008 às 0:55
@gisela – não me parece que a Cultura tenha que ser subsidiada (como o foi neste caso) para satisfazer o prazer de 500 e poucos espectadores em 14 salas de espectáculo. Se os agentes culturais não estivessem exclusivamente dependentes de subsídios do Estado, de subsídios oficiais, provavelmente repensariam as suas actividades. Sei que o rastreio é apertado, mas também sei quais são, muitas das vezes, os critérios que subsistem na atribuição de subsídios.
28 de Janeiro de 2008 às 9:24
again, again!….
falando só dos “critérios”:
os critérios que estão escritos – e foram revistos há bem pouco tempo – para a atribuição de financiamento às artes são muito mais rigorosos e transparentes do que aqueles que financiam alunos que vão ser médicos apenas porque têm a média exigida, ou aqueles que serão professores apenas porque não tinham a média para a formação que pretendiam.
e, já agora, para financiar anos e anos de estragos que um medíocre professor faz, com efeitos multiplicadores, pelas crianças e jovens que lhe passam pela frente – além do péssimo exemplo que passam, como sarna, aos seus colegas de profissão – para financiar médicos que suspiram sem conseguirem sequer, fitar o paciente que têm à frente, ou para financiar autarcas que não cumprem com os seus deveres no respeito das regras democráticas.
teremos todos mais públicos nas salas – de concertos, de exposição, de outros eventos performativos – no dia em que, nas casas portuguesas, se discutir com a mesma paixão, conhecimento e assiduidade a táctica da defesa portista no jogo x e a proposta de encenação da ópera y.
até lá – ou seja, até existir mesmo mais e melhor investimento na educação e na cultura – os adeptos dos eventos performativos para as massas continuarão a ter esse tipo de discurso; eu também gostei de ouvir Pavarotti cantar para um estádio de futebol cheio – e é óptimo que se façam essas transmissões – em directo ou em diferido, só para falar no esforço de popularização da ópera*, por ex.
para os anorécticos destas coisas será bom para abrir o apetite: mas o que é essencial é que o fenómeno artístico cumpra o seu papel de revelador de outras premissas que não as que são esperadas ou consumidas na rotina dos dias – independentemente de qualquer aparato mediático, ou de corrente social.
e aí, não há multidão de estádio que sirva para aferir os “critérios”.
*que sempre houve, mesmo no Portugal dos Pequeninos: recordo-me que em pequena, não podendo assistir às óperas no S. Carlos, ía, com multidões, assistir à sua repetição, com um elenco, na maior parte das vezes renovado, ao Coliseu.
28 de Janeiro de 2008 às 12:17
@gisela – eu agradeço-te essa passagem de bola para outro campo – usando o futebol a que sempre recorres – mas o essencial mantém-se, pois de subsidiadas artes estamos a falar. Que, a meu ver, são um excesso (no pecúnio) num país pobre em todos os recursos. Admito a limitação do meu olhar sobre o assunto, mas já não admito que as minhas contribuições fiscais sirvam para alimentar gulosos fiascos (sejam educacionais, culturais ou desportivos).
28 de Janeiro de 2008 às 20:40
Pois é Sr. Espinho…
Eu sou assiduo no seu blog e desconhecia as suas pericias nos assuntos arte e finança.
Acho que o Sr. merecia ser convidado a ingressar nos quadros da DGArtes ou quiça do Ministério da Cultura.
Eu não sei mas penso que, salvo alguns senhores da direita mal esclarecida, niguém já avalia uma obra de arte em função do número de público, e igualmente ninguém, na nossa civilização ociental, põe em dúvida o financiamento às artes.
As Artes, Sr. Espinho, qualquer arte, com muito público ou com pouco, são um impulso fundamental à melhoria das sociedades, ao contrario do futebol, digo eu.
E mais é sabido relativamente aos pecúnios: Portugal é dos países da europa que menos gasta com a Arte/Cultura. E esta situação que, ao contrario desses outros países não soubemos resolver, é, digo eu, uma vergonha nacional.
Um cidadão que não é culto nem exclarecido não sabe exigir o cumprimento dos seus direitos.
E já agora, só para informá-lo, para que não diga certas coisas que lhe ficam mal… O senhor está a confundir a Arte que se subsidia com coisas como os LaFéria, as Tonichas, o Apita o Comboio, etc. Não é essa, porque essa paga-se a sí própria. É como a M…A, quanto mais fede, mais moscas aparecem. Essa arte é muito facil de fazer e nunca lhe falta público nem pagantes.
E tudo isto é mais que sabido por TODA A GENTE (excepto aqueles outros que referi).
28 de Janeiro de 2008 às 21:00
@rr – percebi que você é uma pessoa culta e muito “exclarecida”. Curvo-me!
29 de Janeiro de 2008 às 0:21
Reconheço que a minha cultura anda pelas ruas da amargura. Já o Sr. não deve precisar, pois avulta-lhe o “pecúnio”.
29 de Janeiro de 2008 às 0:29
@rr – a mim avultam-me outras coisas, que não o pecúnio. A paciência, por exemplo.