Jan 12 2007

Distinção ou Peneira?

Publicado por as 11:05 em Crónicas

(crónica publicada no Correio Alentejo de 12/01/2007)

O presente de Natal chegou ao edifício dos Paços do Concelho já no novo ano, em forma de tabela publicada num semanário de referência e mereceu, por parte dos agraciados, um efusivo comunicado onde se revela o orgulho e a vaidade de habitarmos na “9ª melhor cidade portuguesa para viver”. Sim, estamos a falar da cidade de Beja que, num estudo publicado na revista Única (“Expresso”, 6/1/2007), é avaliada e comparada com outras 39 cidades portuguesas (Continente e Ilhas).

Os 20 critérios que guindaram Beja para uma invejável posição no ranking nacional, que vão desde as acessibilidades à qualidade dos serviços públicos, passando pela oferta cultural, o comércio, segurança e alojamento turístico, entre outros, colocaram Lisboa em 1º lugar, logo seguida de Guimarães e – espantem-se – colocam Évora (sim, a vizinha de Beja), num mui digno 3º lugar. Sem querer apreciar estes critérios e as pontuações atribuídas, sou tentado a dizer que as classificações obtidas fazem das cidades portuguesas locais pouco recomendáveis para viver, pois numa escala de 20, a cidade capital não vai além de um Suficiente, com os seus 13,05 pontos, ficando Beja com 11,55, o que lhe dispensa uma ida à oral.
Certamente que este ranking dará pano para mangas e nos blogues locais – de Norte a Sul do País – já se assiste a acaloradas discussões sobre quem é melhor e quem é pior, quem é que está no bom caminho ou, pelo contrário, anda por maus caminhos.
Mas, dizia eu, este presente que o “Expresso” ofereceu e a edilidade bejense tão carinhosamente agradeceu, pode ser um daqueles presentinhos envenenados, se não houver modéstia e parcimónia ao desembrulhá-lo e, muito principalmente, alguma humildade nos festejos.
Não duvido que Beja tenha boas condições para se viver. Também não terei dúvidas em que as potencialidades da região poderão impulsionar a vontade e o desejo de aqui se querer viver. Cada vez mais as pessoas percebem que não é nos grandes centros urbanos que há qualidade de vida e que o futuro reside nas cidades de média dimensão.
Porém, a cidade de Beja, mercê das políticas que agora a autarquia tanto se regozija de ver elogiadas no referido ranking, não é uma cidade virada para o futuro e as estratégias adoptadas não vão no sentido de estancar a saída de pessoas e serviços.
Já aqui o escrevi e não me cansarei de repetir: a nossa cidade não tem sabido exportar as suas qualidades, tem sido incapaz de potenciar para o exterior o que por aqui se vai fazendo, numa palavra, Beja está fechada em si mesma. Assim, não será difícil de afirmar que a sinalética é suficiente, que vamos sendo uma cidade segura e que os espaços públicos têm qualidade. Quantos menos formos os utilizadores desta terra, menos ela se degradará.
As cidades de média dimensão – e Beja terá que perceber que, se não inverter o actual rumo, a médio prazo perderá vários estatutos – têm que apostar numa estratégia de inovação, têm que ser economicamente competitivas e empenhar-se na diversificação das suas ofertas.
Uma estratégia adequada – e Beja tem estado longe de a adoptar – seria a de cativar empresas na área do conhecimento e das (novas) tecnologias, desenvolver políticas que dessem prioridade à inovação, seria transformar o tecido económico tornando-o competitivo e que, somados ao desenvolvimento cultural, à qualidade de vida e a um ambiente despoluído, tornariam a nossa cidade e a região num território desenvolvido e com futuro.
Mas, como se pode entender pelos foguetes jubilares lançados pela autarquia após a publicação deste ranking, é preferível enaltecer com festejos do que encarar com determinação e sem receios os tempos que se avizinham.
Não quero deixar de manifestar a minha estranheza por, no comunicado publicado no site da Câmara Municipal de Beja se referir que “a cidade de Beja (…) detém uma invejável posição nas categorias da fluidez do tráfego, sinalética e oferta cultural
Ora, para uma cidade que há cerca de 2 anos inaugurou a maior sala de espectáculos do Sul do País e em que a autarquia é detentora da quase totalidade dos equipamentos culturais do concelho, obter 50 pontos numa escala de 100, ficando por isso a meio da tabela, demonstra pouca ambição ou, se quiserem, é mais uma das formas de fazer propaganda, tentando iludir meia dúzia de incautos.
Espera-se, pois, que esta prenda que o “Expresso” colocou no sapatinho dos autarcas da Praça da República não se venha a transformar na peneira com que nos querem tapar o Sol.

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14 Resposta a “Distinção ou Peneira?”

  1. H diz:

    Com data venia, remeto para http://ireflexoes.blogspot.com/2007/01/beja-9-melhor-cidade-do-pas-para-se.html

  2. Anónimo diz:

    em que posição fica a cidade, em que é permitido o funcinameneto de discotecas e afins até altas horas da noite. Sem se respitar o descanso dos que trabalham de dia e “gostariam muito” de descansar á noite

  3. LG diz:

    É curioso verificar como são as reacções a esta classificação em Beja e em Évora. Depois queixam-se de não passarmos da cepa torta…

  4. pontapé na lógica diz:

    É a 9ª melhor de Portugal

  5. celtiberix diz:

    Parece-me que há aqui algo que está a bater ao lado, ou então sou eu que já não bato bem: o que é que não nos deixa “passar da cepa torta”, são as reacções a notícias destas ou comentários (mais que justificados) como o das 02:01 (anónimo)?
    É que me parece que anda uma “desconfiança” enorme no ar em relação a “sair da cepa torta” exactamente por certo tipo de iniciativas da autarquia que a pouco e pouco minam as razões de orgulho (legítimas) que ainda vamos tentando alimentar (o caso das algazarras, com queixas apresentadas contra a CMB na PSP de Beja é disso prova; eu fui um dos queixosos).
    De qualquer das maneiras, admito que eu é que sou reaccionário, sei lá…
    🙂
    Bom 2007

  6. nikonman diz:

    @lg – com o devido respeito, não me parece que sejam as reacções às reacções que façam com que não se saia da cepa torta. Não será, antes, o comunicado da CMB um bom exemplo dessa cepa torta donde jamais sairemos?

  7. pontapé na lógica diz:

    Ó amigo celtiberix

    Atão não seria melhor que a malta batesse palmas a dados que resultassem de iniciativas deste tipo: http://www.evoradistritodigital.pt/noticias/news_item.2006-10-17.0523811727. Atão é o jornal Expresso que vai legitimar aquilo que as autarquias (não) fazem. Porra, essa nem parece sua.

    Um abraço

  8. pontapé na lógica diz:

    O link que referi não funciona.

    Referia-se ao Projecto “Cidades de Qualidade” que consiste num estudo que pretende avaliar, através de uma auscultação dos seus habitantes, a qualidade de vida dentro das cidades que incorporam a Rede Mecine – a Rede das Cidades Médias da Europa, com um número de habitantes situado entre os 50 e os 250 mil, e da qual Évora é associada.

    Nota do editor do blogue:
    http://www.evoradistritodigital.pt/noticias/news_item.2006-10-17.0523811727

  9. coerente diz:

    Se não me falha a memória também recentemente um estudo, julgo que da Universidade do Minho, colocava Beja numa muito boa posição, entre as capitais de distrito, em termos de qualidade de vida (se bem me recordo em 2º lugar atrás de Évora). será que os estudos estão todos errados? Ou será que nós não sabemos apreciar o que temos de bom!

  10. ventura diz:

    Quem recorda aquela dos noves fora igual a zero ?

    Beja é boa para alguns e menos boa para muitos, esta a minha opinião.

  11. atento diz:

    @pontapé na lógica
    Onde ficará a península “Hibérica”????

  12. LG diz:

    Embora tardiamente, mas porque li agora algumas reacções ao meu comentário, acrescento:
    O que nos impede de sair da “cepa torta” é não sermos capazes de ficarmos todos contentes quando dizem bem de nós, que é como quem diz da nossa cidade. O que nos devia encher de orgulho serve apenas para “barafustarmos” uns com os outros. Porque não seleccionamos melhor os momentos e os assuntos que criticamos? Uma coisa são as nossas discordâncias “caseiras”, outra devia ser a nossa postura do competição com outros… Será que fui mais claro, desta vez?

  13. pontapé na lógica diz:

    @atento

    É curioso que tenha reparado numa gralha (grave, diga-se) no meu blog e que venha, depois, publicar o comentário/correcção aqui no Praça. Diz-me muito do seu modus operandis – típico de quem

  14. cmbp diz:

    é só para dizer que eu respondi a um questionário desse estudo efectuado para o Expresso!

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