Abr 14 2005
PALCO DAS ARTES -3-
Folhear a blogosfera é, podemos dizer, uma forma de ler como os outros vêem o mundo e o seu dia-a-dia. Há quem escreva em poesia, quem deixe apenas uma pequena mensagem, outros optam por inserir fotografias, sem qualquer texto, fazendo justiça a quem diz que uma imagem vale mais que mil palavras.
Há, porém, quem escreva de tal forma que, as suas linhas nos transmitem quase um registo fotográfico. São olhares atentos e sentidos.
Um exemplo desta escrita atenta é-nos oferecido pelo blog NOVOS VOOS.
E destaco o texto que o Yardbird escreveu e a que deu o título “UM OLHAR”.
Aquele olhar, quase negro, pintado numa cara pequena, suja de um sujo acumulado de muitos dias, um encardido do pó dos escapes e de rastos de comida, escassa, decerto, mirou-me fugidiamente mas contou-me breve, muitas das histórias que encerrava. Ou eu, pretensioso, assim pensei.
Disse-me como já conhecia aquela esquina quase de cor, e como se cansava de apanhar frio ao colo da mãe. E mais ainda, quando ela o pousava na calçada, em cima de um cartão encostado à parede.
Logo aqui começamos a ter uma imagem bem nítida da figura descrita.
Somos levados para uma realidade que conhecemos, mas que muitas vezes queremos ignorar.
Para que as ilusões se desfaçam, a escrita torna-se mais nítida
Disse-me das noites que se pegavam às madrugadas e estas aos dias e como parecia que era tudo idêntico como se o dia fosse composto por vinte e quatro horas iguais entre si, sempre dolorosamente custosas de passar, e que pouca diferença lhe fazia que fizesse sol, chuva ou vento, fosse de dia ou de noite, porque a fome que lhe abria um buraco no estômago e um vazio nos intestinos que roncavam sempre porque trabalhavam em vão, e o desconforto que lhe gretava a pele, quase se mantinham inalteráveis e insubmissos às poucas tréguas que a caridade alheia lhes dá.
No fim o retrato completa-se. Já não nos restam dúvidas do que lemos, do que estamos a ver. Não podemos fechar os olhos.
O retoque final tem relevo:
Aqueles olhos não olham só. Rasgam as almas de quem lhes devolve o olhar.
Aqueles olhos carregam consigo todas as dores, todas as misérias de todos os meninos do mundo.
São uns olhos tristes. De uma tristeza tão profundamente infiltrada na carne, que me interrogo se alguma vez aquela criança aprenderá a sorrir.
Estas e outras palavras com imagens podem ser visitadas em Novos Voos.
14 de Abril de 2005 às 19:34
Destaque mais que justo.
Muito bem João.
Parabéns Yardbird.
15 de Abril de 2005 às 9:54
Amigo, venho-te agradecer o destaque. Obrigado. Acho que o menino também te agradeceria do coração. Um grande abraço.
P.S.1- Obrigado, Mad :-)Beijinho
P.S.2- J. já vi que o photobucket está em baixo, pelo que as tuas fotos não se vêem. Se fosse a ti, tentava o http://www.flickr.com que dá uma capacidade de 10Gb por mês,raramente tem problemas e…é de borla
15 de Abril de 2005 às 23:59
Concordo a 100% 🙂