Dez 21 2004
Célia -45-
Mariana sentou-se à minha frente. Os seus olhos traziam um traço diferente. Vem seduzir-me, pensei eu. Durante o jantar pouco falámos do que interessava. Meia dúzia de expressões pouco importantes, sobre assuntos ainda mais desinteressantes.
Não sei o que me levou a convidá-la para jantar, num dia em que havia tomado decisões e em que Célia escolhera o caminho do que ela julgou ser o da felicidade.
No fim do jantar convidei-a para minha casa. Precisava que ela me contasse mais do mundo que agora rodeava Célia. Não lhe quis dizer que estivéramos ambos a conversar e que estavam desenhados os nossos rumos. Isso poderia inibi-la de me revelar qualquer coisa que estivesse ainda na penumbra.
Assim que se sentou no carro disse-me: “Ela não vai ficar com ele. É a ti que ama e não lhe passa pela cabeça viver sem ti”! Isto confirmava o que Célia me dissera há poucas horas. Fiquei, porém, espantado, sem fala, quando Mariana confessa “eu tenho uma ligação muito forte com o seu companheiro. Ele tem-se insistentemente declarado apaixonado mas incapaz de o dizer a Célia”. Afinal quantos vértices teriam as nossas vidas? Como poderia eu transmitir a Célia a traição da sua maior amiga.
Mariana leu-me os pensamentos “não precisas de lhe contar. Célia é inteligente e sabe que o seu companheiro lhe é infiel”. Mas saberia ela que Mariana se preparava para ocupar o seu lugar?
“Olha, João, as nossas vidas dão voltas muito grandes. Onde pensavas existir o teu amor por Célia há vértices que se vão desfazendo para depois outros reaparecerem”.
Pensei no enigma que Mariana acabara de me dizer. Incompreensível, vindo da sua boca. Um pouco sem saber o que dizer, é Mariana que completa o monólogo em jeito de conselho: “Olha, vive hoje à noite a tua Lua Cheia. Não é ela que te dá mais nitidez às ideias?”.
Seria de facto uma noite diferente.
“Esta noite é só nossa. A primeira de muitas outras. Amo-te muito. Olha para a Lua e sonha. Vamos em breve concretizar os nossos sonhos. Sente a magia no ar”.
Não fosse esta mensagem de Célia e a noite teria sido mais uma noite.
21 de Dezembro de 2004 às 16:48
isto é mesmo muito bonito… 🙂
22 de Dezembro de 2004 às 8:54
Já se tinham passado uns anos desde a altura em que Célia havia conhecido o que haveria de ser o seu principe encantado por breves meses. Tudo chegara ao fim desde o dia da apresentação em Sintra aos pais do Embaixador X, su esposo.
De repente ela viu a mentira que estivera a viver até ao momento. Dissera-lhe isso mesmo, e fora na altura a sua primeira discussão a sério. Nunca mais as coisas voltaram a ser como antes. Fora de facto uma pagina virada. E ela, aínda meio confusa, preferira vir para Portugal no dia em que o seu ainda esposo, lhe dissera ter uma missão importante no estrangeiro em zona de conflito. Ele havia-lhe proposto uma das suas casas de Lisboa mas ela dissera-lhe que preferiria ir viver para o interior, tendo apesar disso ficado com as chaves dum dos apartamentos de Lisboa.
E foi já na cidade do interior que ela reecontrou Mariana. Ao principio de surpresa por anos de ausencia, mas rapidamente, tornaram-se confidentes, e consoante os estados de alma, inseparáveis. Era daqueas amizades fortissimas que se quebram de todo temporariamente sem uma palavra, para depois reatar com mais força.
-Célia é de facto uma pessoa fora do comum- pensava Mariana para ela mesmo depois de ter tido mais uma das conversas profundas que costumavam travar. Estava em casa de Célia e ela havia-se ausentado dizendo:- Não me demoro- vou só aqui abaixo á caixa do correio. Havia lhe ocorrido, num relançe no meio da conversa, e sem apropósito, que não via a caixa do correio havia já dias! E dizendo isto, desculpou-se pedindo a Mariana que estivesse á vontade e desceu as escadas.
Foi neste relançe que tocou o telemóvel. Tocou uma vez. Tocou segunda. Movida pela felina curiosidade feminina, chamou Célia desejando que ela não ouvisse, e antendeu.
No meio tempo que ela pegou no telelé, pensou dizer de imediato que a Célia estava ausente. Mas a intenção foi interrompida pela voz de homem que falou. Uma voz de timbre magnifico, bem colocada e fascinante:- Estou cheio de suadades tuas, amor… Como tens passado estes dias? Estás melhor?. Ela respondeu qualquer coisa, ia dizer que estava enganado que não era Célia. Mas ele continuou. Com toada mais íntima desfilou alguns argumentos e ditos de caracter privado. Mariana estava fascinada. Ele tinha aquela voz que faz qualquer mulher perder-se…
Tanto que nem reparou que Célia estava a olhar para ela estupefacta. Ela havia subido as escadas com a correspondencia e havia-se aproximado. Devagar e enquanto lia uns prospectos dos Hipers, avisos da luz e água e outras coisas.
Olharam-se nos olhos. Mariana leu-lhe tudo numa fracção de segundos, mas disse-lhe logo:- Toma é para tí!
– Para quem haveria de ser? disse Célia meio a rir fazendo cair o peso do clima que se instalara durante o breve e eterno momento: -É o meu telemóvel….-
-Eu sei- disse-lhe Mariana-Mas chamei-te e tú não vinhas e daí que eu atendí para dizer que tu nao demorarias…
Célia havia entretanto pegado no telemóvel. Desligou quase de imediato com uma cara um pouco aborrecida.
Acendeu um cigarro e voltou-e para Mariana:
– Queres ir comigo a Lisboa amanhã?-
Tenho de ir ver o apartamento, e ele (referia-se ao marido) vai estar cá para tratar duns assuntos e quer estar comigo…
Mariana sentiu o coração bater. Fingindo pouco interesse disse-lhe: -Não sei se posso mas vou ver, mais logo digo-te, `tá bem?
Foi assim que Mariana conheceu o elemento que viria a enriquecer a complexa e intrincada teia de triangulos amorosos que compunham a sua vida…